quinta-feira, 24 de junho de 2021

Entre totens e tabus

Goffman: máscaras sociais

Meu elenco de self atores

Jogando intrigas patriarcais

Em cada local, meus impostores.  


Ritos ancestrais

Fertilidade e seca

Arlequins surreais

Epicuro ou Sêneca


Descubra-se enquanto dorme

Nesse mundo de Aiê e Orum

Totem colorido de Tucum

Cicatriz existencial enorme.


Se cai a máscara, oh Garuda!

Nagas virais de vida e morte

O Samsara saúda


Domada essa face no breu

Muda boca, ninguém que me conforte

O grito de Munch… Nem eu


segunda-feira, 24 de junho de 2019

Painting senses in an orchestra of sweet boiling hot dreams


Live as though it was your last breath
Taste color-blind surreal colorful senses
Let marble live as Botticelli
Do like your creation as Pygmalion
Drink and toast each sound
Be lost, be found, be profound.


Wash your hands in Monet's tranquility lake,
Fire your soul utterly each moment,
Deep dive into the sea of thoughts.


Watch Rembrandt contrasts:
Highlands of cerulean bitter despair,
Orchestra of sweet boiling hot dreams.


Seek desperately for the true embrace
As a dog smell happiness in all
Drown from passion and doubt, oh Cathy Earnshaw!


Touch your innermost fears,
Love till it blows you apart,
dear tainted translucent heart.

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Friboi

Sofre-boi na pastagem
Sofre-boi no abate
Mais um na embalagem
Para que minha fome mate...

Sofre-boi no espeto
Sofre peixe, sofre galeto
Sofre-boi no prato
Sofre beagle, sofre rato!?

Sofre dilatado ganso
Sofre frango com-finado
Sofrem sem descanso!

Sofre no torresmo o suíno
Sofrem pais, mães e filhos
Sofre boi rastreado
Sofre no hormônio os novilhos

Sofre boi no açougue
E não há quem rogue
Sofre boi
com ou sem rodeios

Sofre na maquiagem a baleia
Sofri pela dor alheia
Sofre boi no churrasco

Só free o homem: carrasco.

domingo, 9 de agosto de 2015

Mestres

Grande mestre Ubaldo
Em seus livros me esbaldo
Uma delícia satírica de acarajé
Mistura de Oxóssi e Oxumaré!

SuaSsuna por que parte?
Sua sina é nossa cultura
A inspiração vem da figura
do cordel e da fábula: genuína arte.

Ah que delícia de bobó
Esses escritores, veja só!
Essa brasilidade do frevo ao carimbó.

Ó Formas Rubens,
Ó Formas Alves
Outra perda nestes mares.

As palavras choram
As linhas trazem lírios
As personagens estão em greve
Praias chuvosas, maré baixa

As letras tomam anti-depressivo
Esse luto que luta para aceitar a realidade
Essa mente que tanto mente
Ora oásis, ora turbulência

Onde refugiar os medos,
Estacionar as angústias,
Saciar essa vontade das novelas e suas intrigas!?

Como vamos consolar as metáforas?
Quem vai maquiar as paisagens?

Os livros se curvam frente à genialidade dos Mestres.

Inspiração Poética

Encha-me de luz, ó trevas!
Complete-me de vazio, ó tudo!
Pois o poeta tem de começar do nada
para que a magia o invada no retumbar do coração.

Entupindo as artérias de idéias.
Libertando a fala do sentimento mudo.
Encharcando os ossos de emoção
E exprimindo a sabedoria represada.

Ó palavras, jamais cessem de alternativas fornecer,
Propiciando a explosão que se propaga tipograficamente
e incitando o intrínseco resplandecer d’alma humana.

Ó Musa, conceda a estes músculos fatigados enrijecer,
permita repousar serenamente e alegremente a mente

e alimente de sonho e esperança esta vida insana. 

Criatividade Poética

O que fazer se vejo arte
a cada instante, em toda parte?
Vejo corar-te na cor & arte.

Sou alguém que lima a rima
Da alfazema traz alegria extrema
Do lírio extrai colírio

Sou um louco que vive e versa e vice-versa.
Amo tanto a rosa quanto a prosa.
Verso e reverso o verso e o inverso.

Falando do adverso ou controverso.

Refinaria


Quem me dera o óleo bruto
Das palavras jorrasse
Que injetasse dor às estrofes
E delas vertesse um mísero fruto.

Que refinado fosse este poema
Tornado em explosivos versos
Que mudasse e tocasse
pelo menos um motor vivente.

Que a pressão profunda
inflasse a fraca rima
E a fizesse útil e rica.
(Mas só ar sai da tubulação...)

Quanto desse pré-sal
serão lágrimas desse novo velho Portugal!

Quanta corrupção nesse libriano campo abissal!  

Refeição

Diga, Melpômene, o que é um drama?
Apolo recebe a flecha de Eros
Dafne o despreza e assustada foge...
Cansada em árvore é transformada
Ó, Bernini, que barroca obra
Esse movimento em már-morre eterno!

Ainda raptam mulheres e as violentam
no século XXI: quanta rapina!
Ainda me lembram de Proserpina
Que Rossetti imortalizou

Por Plutão ser-vida no prato da morte

Entes


O que Boticelli pintaria
se soubesse que um pai mudou de sexo
E fez inseminação na mãe dele?
Estranhas sem-entes

Da concha nasce de Vênus
que do mar emerge
O pai-mãe: sopro de Zéfiro
Hora, a mãe-vó, traz o manto

Oeste: Paixão espiritual
Obra genuína, pagã
Valores que se renovam

Quem pode julgar o Desejo?
Ninguém está certo de nada

Só nos resta a harmonia artística

Drummond revisitado – liberdade LGBTQIA

Pedro que amava Carlos que amava Lucas que amava Juca
que amava Dora que amava Léa que amava Rita que amava Dora
que amava Lia que amava orgia
que amava Jó que amava um pó
que amava Minerva que amava erva
que amava Buba que amava uma suruba
que amava a filha que amava o pai que amava o sogro que amava Che
que amava toda a guerrilha...

Che foi para Cuba, Lia não dormia
Jó na baleia, Minerva na guerra
Webber que analisava a burocracia
Marx que criticava a burguesia
Freud que amava sua mãe e sua filha!

Dualidade

Ora Cômico como Thalia
Ora sério como Polímnia
Esse inconsciente animal e inacessível
Esse lado exi-lado de mim

Essa cor transparente
Esse vácuo sonoro
Paladar tão insosso
Toque jaz insensível

Cruz pátea: religioso animalesco
Essa razão que não vê razão
No que faço
Essa dor do vazio
de existir e não saber o porvir

Figueira: há nirvana!?

O culto

Esculpido em Carrara
Forjado em proteínas
Escondido narcisismo
Profundidade rasa
Dorso-duro, mente flácida

Política e religião morreram
Só nos resta
O-culto ao corpo
A imagem

Tradição

Nós homens ainda achamos certo
que lugar de mulher é em casa
que deve comandar a cozinha
E cuidar da filharada

Igreja valoriza mais o corpo
do que guia a alma
Não ao aborto, pedofilia,
Não ao casamento gay!

Com-tradição de cultura
Na camiseta atrás-diz-são
mas na frente só vejo hipocrisia

Bolaño diz num conto
Na sala: alta classe

No sótão: tortura

Pô-ética

Esquecida jaz agora
Ganância sem escrúpulos
Pesquisas manipuladas mundo afora

O romantismo morreu
Poetas sem amantes
Cadê o lirismo de Orfeu?

Pô-ética quem a resgatará?

Só resta um pó-ético...

Só-corro

Só-corro nessa vida!
Vai-e-vem louco
que aproveito tão pouco
esta dádiva recebida...

Peço então socorro
Por que tanto medo
se a gente parte tão cedo!?
E nem diz: “por amor eu morro!”

Dor que me devasta
Como a solidão invade
Se a Terra é tão vasta?

Socorro! Só corro! Basta!
Cadê felicidade?

Por que de mim se afasta?

A vida abriga

A vida abriga
Amizade, amor, aventura
A vida: diária a-briga
Dor, desilusão, clausura...

Ôh briga do homem
Que a deixar princípios nos obriga
Pois pessoas vêm e somem
Nesse teatro que intriga

O-briga-do universo
Que estupenda arte constrói
Depois que batalhas perdidas remói
E nos obrigam a brigar com o verso...


Posto de saúde

 Na cabeça dor lancinante
Delírio: Pandora ou asna de Baleão!?
O soro há muito não pinga
Falta remédio, falta seringa.

Espera, agoniza, infinita tortura
Febre, moleza, tontura.
Um áspero amarelo engole e inala
Consulta: volte depois!
Pois o médico faltou na escala.

Desvio, tanto descaso
Que SUS-tenta omitir
No chão de gente um tapete
Sem bisturi, vai de canivete!?

Na veia entra a agulha
Na visão nada que orgulha
Nada de curativo, nem de exames
Só promessas infames.

Uma pedra... no meio do caminho
Uma pedra no rim
Como voltar da anestesia?
Cruz, a-dor-meço na desigualdade.
Lenços nos túmulos das alas...
Cala o grito, cala a vida.

Viva a indústria farmacêutica
Virose, virose, é dose?
Paleolítico, neolítico,... ansiolítico.

O posto de saúde

O-posto de saúde... 

Human Race

Hurry up or you’ll be late
Losers we don’t tolerate.
Devour the others as you pass by
For not to be the next to cry.

Mindlessly to be the ace
That’s the human race.

Get set for another clash.
Don’t complain if you fall and gash.
Satisfy your increasing needs.
It does not matter if someone bleeds.

Live well at this frantic pace.
Battles are a reality to face.
I’m almost losing my faith
To save my beloved Earth.

Why so many contests?
To recognize I’m not the best...
I can’t stand life is so cruel
Do every time we need to duel?

Rushing over this endless match,
I’m fed up to suffer and scratch.
Accelerated for the nip and tuck,
I forget that competition is luck. (...sucks).

These absurd rules makes me tear
To counter my elimination fear.
Always bustling, I need to shout:

Can’t I escape from the knockout?”

Amortecer

Enquanto eu voo pelo ambiente
Linda aranha prepara a armadilha
Fio delicado e atraente
Quem se prende não se desvencilha

Indefeso caio e me debato
Ela se aproxima do prato
Sua mordida extasia, entorpece
Envenena, amor-tece...

Aos poucos me entrego
não adianta mais minha prece:
É paixão não nego!

Do-eu

Cada olhar querida
É uma enorme ferida
Demais doeu
Dô-eu um tempo!?

Não quero o afago seu
Doeu, não mais me entendo
Só aqui sofrendo

Dó-eu sinto muito
Do-eu profundo... ignorante
Corro-eu de novo

Ver-teu amor distante...

Digestão

A. Massa chegou em casa após um cansativo dia de trabalho. Após o banho preparou a refeição, fritando hambúrguer, esquentando arroz, uma simples salada. Sua mente aos poucos ia se desligando do dia: as ligações, as multitarefas, as cobranças. A adrenalina no sangue diminuía. Mesmo assim continuava com um olhar distante. Estava em piloto automático. Sentou-se no sofá, equilibrou o prato e ligou a televisão.
Um corte na carne, apresentação das principais notícias do jornal. Uma garfada, informações sobre violência no Rio. Trêmulo, aproximou o garfo da boca. Notícias do tempo, mais calmo deu uma mordida. Quase não piscava. Com rapidez engolia os alimentos. De tão desconcentrado os largos pedaços desciam com dificuldade pela garganta empurrados pelo refrigerante.
A informação também era difícil de engolir, de assimilar. Bastidores da política de Lizarb: intrigas, corrupção. O amargo da rúcula lhe invadia as pupilas. A economia e suas antigas novidades: crise e desemprego.
Uns 5 minutos e já acabara. Como seria a digestão de tão veloz refeição? Haveria tempo para absorver os nutrientes? Momento para uma sobremesa: iogurte. Notícias do esporte: grandes clubes, grandes contratos, entrevistas com jogadores e técnicos. Eles esbanjavam saúde. Ele tentava os imitar... Se jogava? Sim. Da mesa do escritório para o sofá, depois para a cama. Sedentário sentia o sabor do morango adocicando a boca.
Uma notícia relâmpago sobre alguma descoberta científica. Mal falavam dos pesquisadores (era um tratamento quase tão importante quanto ao dado aos jogadores). Encerramento da edição. A. Massa continuava em um estado pouco reativo, não conseguia questionar e absorver as informações.

Algumas horas depois e ainda estava estufado. Dor de barriga. Era uma pena. No vasto banquete de idéias, havia pouco tempo para refletir, estabelecer relações, conectar conceitos, apreciar sentimentos, desfrutar memórias, saborear versos, deglutir textos. A. Massa se contentava com alimentos pouco nutritivos: cachorro-quente, hambúrguer. Tudo semi-pronto, já preparado. Não queria, nem conseguia criar novos pratos, novas perguntas, novas oportunidades.

Congresso

Cientistas reunidos para um simpósio sobre um assunto relevante para a humanidade: fotos revelavam novos espécimes flagrados em situações no mínimo inusitadas. Paleontólogos datam os primeiros exemplares com 60 milhões de anos, Andalgalornis steullionatus, predadores vorazes do erário. Evoluíram chegando a Cathartiformes não-catárticos, Accipintriformes espoliaturious, Falconiformes desviatudus, Stringiformes sonegatudus.
As descobertas detalham os hábitos do Uruporcos expertus um raça híbrida do cruzamentos dos Coragups atratus (do grego, korax=corvo, gups=abutre e do latim atratus=vestido de preto,luto) com os Sus domesticus.
Seu habitat são os currais eleitorais onde vivem brincando na lama. Segundo os estudos os ciclos migratórios variam. A cada 4 anos as revoadas se dispersam nas cidades espalhando muitos papéis pelo chão, cavaletes pelas ruas e se envolvem em intensas disputas territoriais para se apropriarem da carcaça municipal ou estadual. Usam seus passos de urubu malandro para bambolear e chamar a atenção em palanques, rádio e televisão.
Há também ciclos curtos de migração da espécie nas quais elas saem dos currais eleitorais e batem asas para o distrito federal. Chegam aos bandos e aos brados para se alojarem em apartamentos funcionais.
Uruporcos são insaciáveis, recebem auxílio paletó para vôos com elegância. Para manter a espessa camada de gordura, suas presas favoritas são caviar, queijo brie ou Pule, champagne Krug Clos d’Ambonnay com 100% de uvas Pinot Noir , vinho Hermitage La Chapelle 1961. Adoram retocar as plumagens alguns com tons acaju e outros com preto graúna.
Facilmente dominam os Anseriformes, vulgo marrecos e os Galliformes, jacus. São relações ecológicas de colonelismo, clientelismo, esclavagismo, parasitismo, chegando a casos extremos de amensalismo educacional (o que impede em alguns estados de se questionar e se desenvolver) e predação do recurso público. Seu principal mecanismo de defesa são as égides dos habeas corpus, foros privilegiados e advogados criminalistas do mais alto gabarito.
É lindo apreciar uma revoada de Uruporcos em seus carros pretos passando pelas asas Norte e Sul. Admirável. Em dias quentes, pousam nas margens dos rios e lagos (Paranoá, principalmente) para beber água e resfriar as pernas para acertar conchaves e lobbies ou receber propinas.
Nos outros poderes em protocooperação estão os Gaviões sanguessugas donos de um saber político, econômico e controle de gastos do maior gabarito. Habitam nos covis e surgem para propagandear que promovem justiça social e inclusão enquanto se apropriam dos recursos e instituições para se perpetuarem eternamente no poder executivo.
No complexo ecossistema descoberto pelos cientistas, há as Corujas paquidérmicas responsáveis por julgar Gaviões e Uruporcos. São processos muito ágeis e pouco burocráticos quase como nos casos dos marrecos e jacus. Em geral, são processos encerrados por prescrição ou esquecimento dos marrecos ou mal-informação dos jacus.
Todos defendem as Águias Leões Tubarões financiadoras das migrações sazonais para os currais e zonas (prostibulares) eleitorais. Estes se alimentam da corrupção nos países e economias em decomposição.
Fato é que os Gaviões adoram deixar seu legado em placas e obras nas quais convidam jacus e marrecos para admirar inaugurações. Já Uruporcos amam fazer ninhos em árvores mortas. Há sempre “Filho”, “Neto”, irmãos, cunhados, sobrinhos cuidando do emporcalhamento chiqueiral. Eles migram com sucesso para defender o ecossistema do país com muito valor, vigor e honestidade.
Uruporcos são desconfiados, comportamento estudado pelos biólogos e psicólogos, pois é de se estranhar já que sempre agem eticamente. Mas não abrem mão (ainda não há artigos sobre o assunto) de seus Uruporcos comissionados para ajudarem nas caças para ordem e progresso nacionais. É muito comum apreciar uma equipe de comissionados em formação 'V' nas jornadas mais longas.
Uma sessão urusuína é divertidíssima, a revoada se atropela em discursos atabalhoados enquanto a mesa diretora coloca pautas em cima da hora para votar os rumos da população (apesar de estudos recentes de ciência uru-política demonstrarem que há ligeiramente um favorecimento do interesse aquilino leonino tubaronês).
Marrecos exploradus se preocupam com a escassez de atividade ecônomica, a dificuldade de tratar dos filhotes, dos bicos e das gripes, porém os Gaviões e Uruporcos dizem a cada 4 anos de modo metódico e eloqüente que Saúde e Educação são prioridade de governo. Não há no mundo marrequino quem duvide da boa intenção de ambas ilustríssimas e excelentíssimas espécimes.
Espantosa foi a recente descoberta dos cientistas que com sofisticados aparelhos de escuta e cruzamento de dados encontraram indícios que vários Uruporcos, Gaviões e Corujas praticavam delitos. Chocante e inédito! Aliás, os únicos predadores conhecidos dos Uruporcos são as Sucuris amarelas policias federalis.
A alta cúpula urubu-suína arquitetou muitos planos para parecer que queriam endireitar as contas e amenizar a vida sofrida de Jacus e Marrecos. Mas sem piorar não há como garantir o sustento de clãs mais poderosos daqui 4 anos nos currais com troca de Uruporcos por Tucanos ricallis ou Galinhas Raposas paralamentaris.
“Tucano bom é empalhado” diz um ditado ecologicamente incorreto. “Galinha raposa não sai do muro” diz um outro e a crença popular é que bota ovos de ouro. Todos envolvidos procurando proteção. A mídia jacu é pouco tendenciosa e faz uma cobertura imparcial de todos os envolvidos em casos de desvio de recursos.
Um outro hábito dos animais analisados é o “Allopreening”. Eles executam a limpeza de outro indivíduo do clã partido aliado (grupo social) cujos motivos reconhecidos pelos biólogos foram: apadrinhamento, posicionamento hierárquico, indicação em ministérios e autarquias, toma-lá dá-cá, ajuda com cobertura de casos de corrupção.

A luta está em aberto, o país pelos ares, desconfiança e medo se espalhando como os aquilinos leoninos tubarões mais gostam para aproveitar rendimentos financeiros para não investirem nada e lucrarem muito. Quem pagará o Pato? Marrecos perdidos e Jacus descrentes se preparam. E continuamos sempre voando para sermos presas dos carniceiros.

Guerra de Canudos


Acabara de se graduar. Formatura bonita, momento de agradecer aos familiares pelo apoio e compartilhar a alegria com os amigos. Na colação de grau eram cinqüenta. Vários diplomas entregues, agora a serem pendurados na parede.
Segunda-feira, findo os estudos e festas era hora de procurar emprego. Começava uma nova guerra. Antes de entrar na universidade os gurus diziam que área estava em plena expansão. Estranho é que ao se formar o momento era de forte recessão na área e não encontrara grandes oportunidades de emprego antes de se formar.
Por isso contratara Antônio, conselheiro... de carreira profissional. Recebeu dicas de como escrever o currículo e carta de apresentação. A outra lição, bem mais difícil, era aprender toda a interpretação cenográfica de como se portar nas entrevistas: não olhe para baixo (olhe nos olhos); não cruze os braços; não gesticule (será que o ideal seria mover apenas os lábios?); conheça o que a empresa faz; seja sincero: não minta, só omita a verdade.
Primeiro processo seletivo, começaram com formulários intermináveis: nome, endereço, telefone. Depois questões pessoais: informe três maiores qualidades e três defeitos (a parte mais difícil), descreva seus sonhos (podia dizer que dependia do dinheiro disponível?). Logo após, uma série de questões técnicas práticas bem mais desafiadoras que as aulas teóricas que precisou estudar para se formar.
Passando na primeira fase, dias depois foi convidado para participar de uma dinâmica de grupo. Na roda em que se formara, identificou quatro ou cinco colegas de turma. O coordenador apresentou-se como Euclides da Cunha (por algum motivo o nome soava familiar). Pediu que todos se apresentassem e contassem um pouco de seus metas profissionais e pessoais e porquê gostaria de trabalhar na empresa. Cada indivíduo usava como arma a melhor eloqüência possível para explanar sobre suas prioridades, gostos, êxitos alcançados e objetivos para o futuro. Euclides registrava tudo atentamente. Eram seres humanos com objetivos muito semelhantes de usar sua saúde e capacidade de trabalho para buscar felicidade com sua família e amigos.
Quando todos terminaram Cunha determinou que se formassem grupos de 5 pessoas de acordo com as posições em que estavam sentados. No total 3 grupos. Então receberam um problema real da empresa que precisava ser resolvido de modo consensual pelos membros da equipe. Aí, a batalha efetivamente começou, cada indivíduo defenderia sua ideologia. Não haviam escudos, canhões, espadas, sertanejos, governo, rico ou pobre, monarquia ou república. Mas haviam canudos se digladiando nas idéias, na habilidade de persuasão e na capacidade de raciocínio. Sou bacharel USP, outro mestrado em Oxford, e outro pós doutor em Stanford, e outro falo 5 línguas, e mais outro intercâmbio social na África do Sul. Réguas balançando, lápis pontiagudos perigosamente rabiscando. Certamente haveriam baixas em ambos as frentes, apenas dois seriam contratados.
Com muito vibração recebeu a notícia que estava selecionado para a última etapa da seleção: a entrevista. Com nervosismo aparente atuou no palco do escritório para o chefe ( seria do exército?) conforme Antônio lhe ensinara.
Ansiosamente aguardou pelo resultado. Recebeu-o via correio eletrônico. Descobriu, contudo, que conselheiro estava do lado errado para aquele processo: a empresa precisava de um outro perfil, mais despojado. Fora capturado e rendido pelo inimigo. Derrotado na derradeira etapa da luta.
Apesar do desânimo, sabia que a vida teria de continuar, pois as guerras nunca cessam. Além do mais, a vantagem da juventude é que há bastante ânimo para tentar novamente por várias vezes.

Certa vez o rapaz leu na Internet que: “Racionalize assim: enquanto houver muito mais candidatos do que vagas, o mercado não se preocupará com os sentimentos das pessoas. Se um dia, no entanto, chegarmos ao nível de pleno emprego tão sonhado, serão eles que correrão atrás de você”. Enquanto esse dia utópico não chega, continuaremos com conselheiros e guerras de canudos. 

Acidente planejado

Carros freando, buzinas, sustos e gritos ecoando, arrepios, volantes girando, alguns saindo no acostamento. Vidros, vidros e mais vidros estilhaçados. Engarrafamento, ambulantes passando: “Olha água geladinha: 2 real!”. Inflação.
Pessoas impacientes, pessoas que não olham mais umas para as outras. Pessoas ouvindo rádio, navegando no celular, vendo o tamanho do congestionamento não-nasal – aliás antes fosse o nasal -, pessoas se desculpando no telefone pelo atraso.
Calor extremo, crianças pulando nos bancos, mães enfurecidas. Pessoas pelo acostamento sentindo-se mais que os outros na fila. Pessoas com carros turbinados engatinhando a 5 km/h. Dinossauros queimados na gasolina.
Alguns aliviando a ansiedade no cigarro, outros no movimento frenético dos dedos, batuque no volante, vidros abertos, mãos mandando tudo à #! Portas se abrindo, gente descendo do ônibus, motos e automóveis. Todos perguntando o que se passava, sem olhar no rosto, sem ouvir, afinal eram estranhos que se a Entidade Superior do Universo quisesse não voltariam a rever-se.
Polícia rodoviária chegando, um zigue-zague para abrir espaço, reclamações. Espertinhos tentando ganhar terreno. Tudo parado novamente… Um breve silêncio impaciente.
Sirenes, sirenes, forte som, aquela dúvida: será que morreu alguém? Ambulância abrindo as portas. Paramédicos imobilizando o paciente.
Chega um curioso e pergunta: “é grave?”. A atenção dos médicos e enfermeiras é tanta que não há resposta. Achei a carteira dele no chão, diz outro. Nome: “Trânsito”.
Helicóptero chega, cortejo para o atendido. Trânsito carregado. O trânsito não tinha planejado esse fim, esse caos, esse amontoado de pessoas olhando perplexas sem conseguir uma solução racional.

No outro veículo preso nas ferragens estava o Governo: imóvel, sem sentido. Os bombeiros não conseguiam resgatá-lo, população observava de longe, o governo não tinha seguro, não tinha plano (de saúde). A infraestrutura agonizava do lado, esposa tão maltratada desde os tempos coloniais, com uma fratura exposta de um país inerte. A Educação tão pequenina já não respirava, tão esmagada que fora, sem cinto, sem verba, sem estímulo. Só lágrimas, lamento e esperança dos que passavam na pista recém liberada do acidente.

Carta-soneto aos insanos possuidores de capacidades estranhas

Quem tiver olhos para cheirar, ouça!
Neste mundo, como acharei virtude?
À paz, quando dar-se-á magnitude?
Por que há quem a pobreza mereça?

Quem possuir tato para olhar, escute!
É necessário resgatar esperança.
Precisamos sonhar com real mudança.
Pense, proponha, pratique, vença, lute!

Aquele que tiver nariz para ouvir, veja!
Quando a crença será livre da dominação política?
Como espalhar amor a quem quer que seja?

Aquele que ouvido adquirir para comer, toque!
Para que temermos de lutar essa batalha tão crítica?
Força e alegria necessitamos para não mais andar a reboque.

O adstringente sabor azedo da paixão

Li em seus olhos os sonhos sublimes.
Fitei seu rosto compassivo e translúcido.
Saboreei singelamente seus movimentos labiais.
E inalei os mais homéricos sentimentos puros.

Tateei cegamente até encontrar seus poros.
Escutei as artérias ao pesquisar seus ciclos vitais.
Descrevi minuciosamente seu pensar tão nítido.
Pressenti bons auspícios em seus passos firmes.

Implorei para que ouvisse este servo ignóbil.
Supliquei que se rebaixasse e me amasse.
Roguei e meditei pacientemente sobre nosso destino.

Chorei alhures quando rejeitou-me em sua elegância sutil.
Custou-me acreditar que não adiantaria se gritasse.
Prostei-me assim mesmo perante sua face apesar do desatino.

Racionalmente guiados pelo medo

Acabara de voltar à sua casa após uma caminhada. Subiu as escadas para tomar um banho. Um clique no interruptor e a luz do banheiro acendeu-se. E eis que em cima do tapete no centro do cômodo aparecia aquela imagem indesejada: uma barata! E das grandes! Será que voava? Por quais esgotos já havia passado? Um temor - semelhante aquele que tinha ao andar em ruas escuras à noite e passar por estranhos - resplandeceu em seu semblante.
O duelo parecia promissor. De um lado: 1,78m com polegar opositor, bípede e córtex desenvolvido. Do outro: 5 cm, com inúmeras patas, duas asas e resistente à radiação.
O animal irracional, mais precisamente, um inseto, balançava suas antenas possivelmente na tentativa de localizar o motivo pelo qual o ambiente havia mudado bruscamente. Imóvel, tal qual uma pessoa que teme novos passos quando as súbitas mudanças afetam consideravelmente sua percepção e situação no mundo, parecia refletir sobre qual a próxima atitude a tomar neste ambiente hostil.
Por sua vez, o animal racional, especificamente, um mamífero, gritava instintivamente e freneticamente por um chinelo. Em poucos instantes, seu irmão M que estava no quarto ao lado, veio assustado prestar assistência e observou o invertebrado. Mecanicamente, tirou seu enorme RIDER 42 e arremessou sobre o chão.
Ao menor sinal de movimento, o morador de esgotos rastejou rapidamente para fora do tapete. Contudo, o calçado lançado explodiu de raspão em sua preta carapaça e o impacto lhe deixou de cabeça para baixo.
Totalmente indefesa, assim como as crianças nas guerras procurando avidamente por seus pais em meio ao fogo cruzado, o diminuto ser mexia desesperadamente suas patas para fazer seu abdômen voltar a tocar o chão. Era como um bebê no berço que mexia suas pernas e braços e soluçava lágrimas para pedir alimento e proteção.
Enquanto isso, M sugeriu que seu irmão P pegasse o outro chinelo do par e executasse o abominável, sujo, invasor de lares e habitante das profundezas.
Acometido pelo instinto ancestral impresso em seus genes e torpe de medo por um animal inofensivo, mas potencialmente perigoso, P tomou o chinelo em suas mãos.
Entretanto, faltava-lhe o ímpeto para desfechar o golpe fatal. Ao pensar no estresse pelo qual era diariamente submetido e não conseguia extravasar, sentiu uma brecha para descarregar suas frustrações no amor e no trabalho, causados pela timidez e medo do fracasso. Então, brandiu quase instantaneamente seu "tacape" sobre o ser vivo. Melhor dizendo, morto esmagado agora.
Passada a adrenalina e recobrando a consciência, P pensava como pudera cometer tamanha atrocidade. Baratas teriam alma? Teriam vida após a morte? Reencarnação ou Reencarapaçamento? Qual seria a dor que P sofreria caso fosse daquela espécie e levasse um golpe desferido com tanta fúria? E os familiares de B, o que sentiriam? Infelizmente, esses questionamentos foram passageiros na mente de P, pois seus pais logo vieram para varrer o intruso e jogá-lo no lixo.
P desceu a sala e ligou a TV. Notícia internacional do dia: míssil lançado contra terroristas erroneamente atinge bairro residencial em Bagdá. 15 mortos recolhidos ou "varridos" dos escombros pelo medo da diferença. Sem tempo para raciocinar sob a relação entre os dois fatos, já era mostrada a previsão do tempo...